Por Fabio Cerqueira
Valorização radical da verdade é essencial para uma sociedade democrática
Neste 08 de janeiro, dia que completa um ano de um dos fatos mais vergonhosos da história recente do Brasil, acontecerão em todo o Brasil uma série de atos populares em defesa da democracia, além de eventos simbólicos e políticos envolvendo os três poderes da república. É uma resposta legítima a um sistemático afronte à democracia brasileira que teve seu ápice na tentativa de golpe aos moldes da Revolução Francesa às avessas – inclusive com ameaça de enforcamento de agentes públicos em praça pública -, mas que foi alimentado durante anos por uma extrema direita raivosa e recalcada que encontrou em Bolsonaro a figura ao mesmo tempo autoritária e populista que sempre desejou, e contou também com um sistema sociopolítico que apresenta sérias falhas na inibição do crescimento de movimentos antidemocráticos.
Para quem acompanha os noticiários diariamente, por mais absurda que pudesse parecer a ideia de uma tentativa de golpe na força bruta, os acontecimentos de um ano atrás não foram lá uma surpresa. Era evidente o aumento tresloucado da violência nas bolhas da extrema direita, especialmente depois da derrota bolsonarista nas urnas. No X (antigo Twitter), o perfil “Prints Bolsonaristas” publicava diariamente capturas de telas de grupos bolsonaristas do Telegram com ameaças explícitas de ataque a autoridades políticas e a locais que representavam as instituições democráticas. A obstrução de rodovias e aeroportos nos últimos meses de 2022 com a conivência da PRF era uma pequena demonstração do que estaria por vir. Mas então, como permitimos que a situação chegasse a este ponto?
Apesar da forte reação do sistema judiciário brasileiro aos atos daquele 08/01, com 30 pessoas já condenadas e outras dezenas em investigação, além da CPI que demonstrou a responsabilidade de agentes políticos no desenrolar da tentativa de golpe, poucas foram as mudanças implementadas no sistema sociopolítico que iniba novas aventuras golpistas. Os especialistas apontam, dentre outras coisas, a necessidade de maior regulação das redes sociais, com o controle mais assertivo da divulgação de notícias falsas e punição a usuários que incitem atos antidemocráticos; uma reforma do sistema partidário brasileiro que enfraqueça os extremismos; e a restrição da participação de militares nas atividades políticas destinadas a civis. Mas nós, enquanto cidadãos, precisamos também fazer nossa parte neste processo, o que passa necessariamente à valorização radical da verdade factual.
Fabio Cerqueira é gestor e produtor cultural, Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela PUC-Campinas, Especialista em Cultura e Educação pela FLACSO Brasil e Mestrando no Programa de Mestrado Interdisciplinar em Ciências Humanas e Sociais da Unicamp.