Multa de R$ 5 mil para quem for flagrado pichando edificações públicas ou privadas. Porém a paisagem cultural de Valinhos vem sofrendo recentemente com a rápida transformação gerada pela aprovação desenfreada de torres e mais torres de apartamentos em todos os cantos.
Por Fabio Cerqueira
Durante a organização das festividades dos 50 anos da Praça Washington Luiz, o Pé de Figo contou com a parceria voluntária do excelente designer e artista plástico valinhense Alexandre Filiage na criação da marca do evento, na intenção de retratar de forma estilizada o esplendor de nossa praça. Ao receber a primeira proposta de arte, senti a falta de algo, de algum elemento que identificasse facilmente que aquela praça era a nossa PWL, e não qualquer outra praça do interior de São Paulo. No mesmo instante peguei meu carro e me dirigi para a praça para identificar na paisagem do entorno algo que fosse marcante e que provocasse, em qualquer valinhense que batesse o olho, uma identificação instantânea com o local.
Não precisei nem chegar até a praça para saber qual seria esse elemento. De longe, já identifiquei algo que se destaca na paisagem valinhense de forma quase onipresente: a chaminé vermelha e branca da fábrica da Unilever. A inserção deste elemento no desenho deu a característica que faltava na composição.
A cada ano que passa, porém, a bela chaminé vem recebendo mais e mais concorrentes à altura – com o perdão do trocadilho – na paisagem valinhense. A cada nova torre fálica erguida, a chaminé vai escondendo seu encanto.
A paisagem cultural de uma cidade se relaciona diretamente com a formação da identidade de sua comunidade, e pode (ou deve?) ser protegido inclusive com processos de registro e tombamento, garantindo a preservação da identidade cultural dos que ali residem. Porém a paisagem cultural de Valinhos vem sofrendo recentemente com a rápida transformação gerada pela aprovação desenfreada de torres e mais torres de apartamentos em todos os cantos. E a única punição para quem aprova projetos que deturpam o nosso panorama cultural, no entanto, continua sendo nas urnas.
Por outro lado, temos as pichações. Ah… as pichações, que já há muitos anos fazem parte da paisagem urbana de cidades do mundo todo, essas sim continuam incomodando – e muito – o poder público. Nos últimos dias tivemos a publicação de um Decreto regulamentando o projeto “Pichação Zero”, definindo uma multa no valor de 25 UFMV (Unidade Fiscal do Município de Valinhos”, ou seja, uma multa que se aproxima dos R$ 5 mil, para os cidadãos que foram flagrados pichando “edificações públicas ou particulares, equipamentos públicos, monumentos ou bens tombados e elementos do mobiliário urbano” de nossa cidade, para, dentre outras coisas, “assegurar a qualidade estética e ambiental da cidade para seus habitantes”. O que a portaria define como pichação é “o ato de riscar, desenhar, escrever, borrar ou de qualquer outra forma sujar” os elementos já citados. Acho que não é só eu que acha essa definição um tanto quanto abrangente demais.
A pichação é uma forma de manifestação de origem periférica. Assim como acontece com os denominados artistas, a pichação é uma forma de comunicar a cultura de parte da população através da ocupação de espaços “brancos” da paisagem urbana de alta visibilidade com suas palavras de ordem, mais ou menos apuradas esteticamente.
Sim, já tive o muro de casa pichado. E é claro que uma pichação pode vir a causar prejuízo ou deterioração do espaço urbano, mas não maior do que a que está sendo causado pela construção sistemática de torres de prédios e avanço da mancha urbana por cima das chácaras de nossas terras. O que não convence é essa desproporcionalidade de tratamento entre uma coisa e outra.
E por falar nisso, dentro do amplo conceito de pichação deste programa, a quem cabe traçar o limite entre o que é arte e o que é vandalismo? Suspeito que não sejam nossos políticos.
Fabio Cerqueira é gestor e produtor cultural, Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela PUC-Campinas, Especialista em Cultura e Educação pela FLACSO Brasil e Mestrando no Programa de Mestrado Interdisciplinar em Ciências Humanas e Sociais da Unicamp. Presidente do PSOL Valinhos.