“O bater de asas de uma borboleta no Brasil pode desencadear um tornado no Texas” [Edward Lorenz]
**
Romildo é um jovem morador da periferia de uma metrópole. Batalhador, ele trabalha em um escritório no centro da cidade, e nos horários disponíveis pratica teatro, a sua paixão. Romildo tem como meta tornar-se um ator teatral de sucesso, mas ainda não sabe quando conseguirá alcançar este alvo.
Acostumado a ir para o centro de carona com um amigo, que entra mais cedo que ele, certo dia Romildo preferiu dormir até um pouco mais tarde, e assim, teve que ir de ônibus até o trabalho. Quando pegou o ônibus, este estava relativamente vazio, e Romildo escolheu um lugar, e sentou-se. Alguns pontos à frente, uma moça, Ana, entrou no mesmo ônibus, viu o lugar ao lado de Romildo livre e decidiu sentar-se ao lado dele.
Já chegando no centro da cidade, Juan, um rapaz marrento, decide discutir com o cobrador por um suposto troco errado que este havia lhe dado. O cobrador, porém, afirmava ter dado o troco correto, e dizia que, se pagasse a mais, depois teria que repor do próprio bolso.
Ruana, que estava de pé próxima à discussão, resolveu encerrar o bate-boca oferecendo as moedas que estavam em seu bolso para complementar o troco que Juan exigia do cobrador.
Encantada com a atitude de Ruana, Ana fez um breve comentário com Romildo, que sequer conhecia, mas estava ali sentado de seu lado. Romildo se disse também impressionado com tal postura, e naquele momento começaram um papo casual. Em meio a apresentações descontraídas, Ana contou a Romildo que era diretora de TV, e que estava participando da seleção do elenco para a próxima telenovela. Romildo empolga-se, e revela sua paixão pelo teatro, no que Ana decide convidá-lo a fazer um teste para um papel da trama.
Aquele foi o início da longa carreira de Romildo nas TVs brasileiras.
**
Você, leitor, reparou a quantidade de sucessões de decisões de ao menos 5 pessoas – Romildo, Ana, Juan, o cobrador e Ruana – tiveram que acontecer para que Romildo tivesse encontrado a grande oportunidade de sua vida?
Às vezes temos a impressão de possuirmos o controle de nossas vidas em nossas mãos, de podermos decidir o nosso futuro, porém as nossas relações sociais interferem mais em nosso cotidiano do que podemos imaginar. Cada decisão que tomamos e transformamos em ação impacta de alguma maneira na vida daqueles que estão em nosso circulo social. O impacto pode ser pequeno ou grande; ou até aparentemente pequeno, mas que gera uma sucessão de fatos que o torna imenso, como descrito na famosa frase de Edward Lorenz, proponente da Teoria do Caos, que abre este texto.
Proponho um exercício: releia a história acima, e tente identificar que possibilidades de decisões diferentes poderiam mudar o curso do futuro de Romildo. Será que apenas uma decisão diferente poderia fazer com que Romildo passasse o resto da vida trabalhando em escritórios, ou então o levado ao teatro, seu sonho, ao invés da TV?
Quando planejamos algo, é como se criássemos um alvo, mas entre nós e o alvo existe uma série de obstáculos que podem alterar o trajeto de nossa flecha. Podemos, com muito foco e determinação, acertar o alvo, mas dificilmente acertaremos exatamente em seu centro, pois, de fato, não temos o controle total sobre aquilo que almejamos, e os obstáculos – as decisões das pessoas que nos cercam – sempre nos desviarão ao menos alguns milímetros das nossas trajetórias.