Na última sexta-feira aconteceu no Espaço Cultural Multiuso Flávio de Carvalho, antigo Centro Cultural (que pelas notícias logo dividirá essa posição de “antigo” com o atual Centro Cultural Vicente Musselli, que parece estar indo para um novo endereço, pouco mais de um ano depois de inaugurado), a exposição do escultor e chargista Catuí. A minha opinião em relação àquele espaço, como espaço expositivo, continua a mesma, está muito longe de sequer chegar perto de cumprir as necessidades de um espaço para exposições, mas deixemos essa discussão pra depois e vamos falar do artista e sua obra, afinal, trata-se de um dos grandes artistas da cidade e que generosamente está doando ao município um grande acervo de obras de sua autoria.

É um momento histórico, pela primeira vez em sua história Valinhos está oficialmente criando um instrumento de preservação de obras de um artista da cidade. Há que se deixar registrado que essa iniciativa partiu de pessoas de fora do poder público, reconhecendo o esforço e a preocupação dessas pessoas quanto a esse grande tesouro artístico que agora passa aos cuidados do poder público, que tem a obrigação de garantir a sua preservação. Apesar da iniciativa da criação desse acervo ter vindo de fora, há que se reconhecer, e parabenizar a Secretaria da Cultura por não ter se esquivado da responsabilidade e de ter assumido, junto com a APHV (Associação de Preservação Histórica de Valinhos), a tarefa de tornar isso uma realidade.

Fico aliviado de ver essas obras passando a fazer parte desse acervo, me afligia a possibilidade de terem o mesmo destino das obras de outros artistas da cidade, alguns já esquecidos, com muita coisa já perdida, ou em vias de, para sempre. Minha esperança é que estejamos iniciando uma nova era, que a criação desse acervo venha futuramente abrigar obras de outros importantes artistas da cidade, alguns já falecidos. É um primeiro passo, mas que já comprova a necessidade de um museu para abrigar essas obras de forma adequada e permanente na cidade. Há muito venho falando do antigo prédio da Câmara, um prédio histórico, central, que deveria ser transformado em um equipamento cultural, abrigando dentre outras coisas esse museu.

Walter Seufert, conhecido como Catuí, nasceu na Alemanha em 1930 e vive no Brasil desde 1955. O conheci em 1996 durante a realização do 1º Panorama das Artes Visuais de Valinhos, ficamos amigos logo. Durante esses mais de 20 anos de convivência, de incontáveis horas de ótimo papo, regadas a um bom vinho, ou cerveja, geralmente escura. Conversar com o Catuí sempre foi uma experiência fabulosa, eu achava inacreditável que alguém pudesse ter tanto conhecimento na cabeça, tanta cultura, tantas histórias, ele sempre sabia pelo menos dar uma pincelada sobre o assunto, nunca consegui fazê-lo dizer “eu não sei nada sobre isso”.

Saboreava essa convivência, esses momentos, de tantos jantares e almoços na minha casa, ou na casa dele, apelidada carinhosamente de “Toca do Catuí”,

o “epicentro” da arte em Valinhos, como ele costumava dizer. Juntamente com o também artista Alexandre Filiage, formamos um trio de amizade perene, que dura até hoje, apesar dos encontros já não ser mais tão frequente por vários motivos, mas não por falta de vontade. Vivemos juntos momentos de imensurável alegria, de ode à vida, e também alguns difíceis, que serviam para mostrar que a vida não é só felicidade, vinho chileno e arte, e que devíamos dar valor a esses momentos, pois nada dura para sempre.

Hoje com mais de 87 anos e o peso de todas as décadas cobrando seu preço, ao olhar para trás ele certamente não olha com arrependimentos, teve uma vida inacreditavelmente intensa, rica, viveu o que a maioria dos mortais não viveria nem de tivesse 300 anos de vida. Ver parte da sua obra preservada me deixa muito feliz e aliviado, só lembro da importância da preservação não só das obras de arte, mas também de toda documentação escrita e em imagens que ele guardou por toda vida, isso será de suma importância para futuramente podermos contar a história de vida dele, que dará um fantástico livro nas mãos de um bom e competente escritor. Eu conheço muito dessa história, mas não sou escritor, não me atrevo a realizar tal tarefa porque ele merece o melhor.

Para quem quiser conhecem mais sobre a vida e obra dele vale muito a pena visitar o blog que ele criou em 2008 e atualizou até 2012, com centenas de posts, o Diário do Catuí http://catui.blogspot.com.br/. Há também o livro “Charges e Esculturas” que publiquei em 2013 com um pouco do trabalho dele.

Genivaldo Amorim é artista plástico e produtor cultural.




1 Comentário

  1. Catuí
    Após muitos anos de dedicação à empresa Siemens, as oportunidades que se me apresentaram na vida profissional foram bem aproveitadas.
    O velho ditado popular diz que “o cavalo não passa ariado duas vezes na sua frente”, então, “embarquei” em alguns desafios, dos quais não me arrependo. Se por um lado talvez tivesse dispendido muito tempo, não deixando ver “outros cavalos selados que passavam na porta”, trouxeram-me experiências e sabores de conquistas pessoais muito gratificantes.
    Nessa corrida, uma das coisas que ficaram foi a admiração pelo cartunista Walter Seufert, hoje com 86 anos, que a Siemens teve como colaborador, conhecido por suas charges assinadas como Catuí.
    Recentemente o encontrei, num desses encontros de ex-colaboradores e pudemos conversar por um bom tempo. Chamou-me a atenção sua reclamação de ter sido roubado na sua própria casa por uma pessoa inescrupulosa que se apossou de muitas de suas charges e obras de arte e apresentou-as depois como sendo de sua criação. Mas esse fato não vem ao caso, fica apenas como registro.
    Vou tomar a liberdade de transcrever aqui um breve relato de sua história, absorvida de uma publicação da Siemens, comemorativa do jubileu do Catuí, em 1986.
    Quote
    Catuí: A história de um índio alemão
    Walter Seufert nasceu a 12 de maio de 1930, em Karlsruhe, no Sul da Alemanha. Seu pai era ferroviário e sua mãe, como ele mesmo diz, “u’a mãe como todas as mães do mundo”.
    Frequentou a escola juntamente com seu irmão gêmeo Werner. Ele reconhece que a dupla era terrível!
    Dentro e fora da escola.
    Em abril de 1945 terminou a escola, mas, devido às consequências da guerra, só conseguiu arrumar seu primeiro emprego em fevereiro do ano seguinte. Foi trabalhar como aprendiz de escultor em uma marmoraria, nos arredores de Karlsruhe.
    Paralelamente, durante os três anos de aprendizagem, frequentou a escola profissional formando-se em 1949, como “escultor em pedra”.
    Completando sua formação artística e profissional Seufert frequentou uma série de cursos de arte, em diversos estabelecimentos.
    Em 1955, resolveu conhecer o mundo. Escolheu o Brasil, como primeiro contato com o mundo exterior e daqui não mais conseguiria sair. A cidade do Rio de Janeiro foi sua primeira escala.
    Estava somente há três meses em terra brasileira e não perdeu tempo: casou-se! Como relata Seufert: “Sem falar português, sem dinheiro e sem emprego, aceitava qualquer tipo de trabalho, desde retoques em fotografias e renovação de esculturas à colocação de ladrilhos e azulejos.”
    Sua esposa, Eva Jutta, trabalhava em um laboratório fotográfico.
    Um ano depois, finalmente, nosso amigo Seufert conseguiu seu primeiro emprego regular no Brasil.
    Era uma casa portuguesa de decoração, que produzia peças em gesso. Lá ficou até 1960.
    Após essa data, resolveu trabalhar por conta própria, “aguentando-se” por um ano, mais ou menos.
    Em Novembro de 1961, entrou para a então “Siemens do Brasil”, no Rio.
    Em maio do ano seguinte foi transferido para São Paulo, onde trabalhou na área de telecomunicações.
    Em agosto de 1966, provavelmente, “bateram as saudades” da terra mãe. Desligou-se da Siemens, em São Paulo, retornando com a família para a Alemanha. Lá, em Karlsruhe, trabalhou na Siemens / Messtechnik.
    Após um ano, percebeu que estava demasiadamente tropicalizado e seu sangue, como diz ele, “inundado do bacillus brasiliensis”.
    Voltou para o Brasil.
    Permaneceu na área de telecomunicações até fins de 1976 quando foi convidado para assumir a coordenação de audiovisuais do setor de treinamento. Passou, então, a conviver com os equipamentos de filmagem e de vídeo.
    A produção “em massa” de charges começou, praticamente, logo após a volta de Seufert da Alemanha, em 1967.
    Por volta de 1970, nasceu Catuí. A Editora Abril, que publicava trabalhos do artista, sugeriu que ele passasse a usar um nome bem brasileiro, já que Seufert (pronuncia-se ZÓIFERT), para os brasileiros, é um nome quase impronunciável.
    Assim, nasceu Catuí, um índio… alemão!
    Hoje, após mais de dez anos na área de treinamento, Seufert, ou melhor, Catuí, pretende continuar envolvido com os filmes e vídeos, segundo suas palavras “enquanto a saúde permitir e a Siemens me aguentar”.
    É claro que a produção de charges vai continuar, por muito tempo.
    Umquote

    Catuí foi um respeitado colaborador da Siemens durante trinta anos, aposentando-se em 1991. Um ano depois mudou para Valinhos-SP, onde reside atualmente. À partir daí começou produzir novamente esculturas, usando como matéria prima a argila. Participou regularmente em Exposições, tanto em Valinhos, Vinhedo, Salto, São Paulo e outras localidades da região. Em agosto de 2004, participou em uma exposição, em Worpswede-Alemanha do Norte.
    Bom, tudo isso apenas para apresentar o criador da charge acima, para demonstrar um pouquinho de sua perspicácia nas suas charges com muito bom humor e respeitável irreverência.
    Catuí manteve até algum tempo atrás um blog, http://catui.blogspot.com.br/ atualizado até abril de 2012, através do qual se poderá conhecer um pouco de sua arte.
    Se por acaso você encontrar alguma peça ou trabalho que possa guardar alguma semelhança com o trabalho de grande colega, por favor nos informe. Pode ser que seja uma de suas obras “desviadas”.

Deixe um comentário

Por favor, digite seu comentário.
Por favor, digite seu nome