No último domingo, estive com minha esposa e filha no Teatro Multiuso da Câmara Municipal de Valinhos para mais uma bela apresentação da Orquestra Filarmônica de Valinhos, uma das joias da cultura valinhese, motivo de orgulho para a cidade. Além do competente concerto, me chamou atenção os espaços vazios na plateia, coisa, infelizmente, comum aqui na cidade. Apesar dos baixos preços dos ingressos e dos concertos serem realizados uma vez por mês nas manhãs de domingo, é sempre uma tarefa hercúlea levar público às apresentações, e isso não acontece somente com a OFV, acontece com a maioria dos eventos culturais da cidade.

Uns dias atrás uma matéria publicada no site da prefeitura de Valinhos trazia a seguinte manchete: “100 Dias: Cultura coloca casa em ordem, amplia parcerias e bate recorde de alunos em cursos”, destacando o recorde alcançado de 3.800 alunos matriculados nos diversos cursos oferecidos pela Secretaria de Cultura, e que aliado ao slogan adotado pela Secretaria desde janeiro, #CulturaParaTodos, nos leva a crer que vivemos em uma cidade com grande desenvolvimento cultural. Mas como explicar então que se gaste a maior parte do orçamento para a cultura com esses alunos e ao mesmo tempo tenhamos essa grande falta de públicos nos eventos locais? O grande problema é que Valinhos adotou há um bom tempo um modelo cujos resultados refletem muito mais em possíveis números de votos nas eleições do que em real formação de público para a cultura.

Eu sempre fui crítico em relação a essa ideia de que o melhor caminho para se despertar o interesse da população para com a cultura seja simplesmente oferecer a ela a oportunidade de “brincar” de artista por um tempo. Sou contra cursos e oficinas de arte? Claro que não, pelo contrário, só não acredito na eficácia deles como instrumentos formadores de cidadãos consumidores de cultura quando são aplicados de forma isolada, como único caminho. São eficientes quando a formação vai além do aprendizado de técnicas.

A grande verdade é que há muito tempo o Centro Cultural se transformou numa espécie de grande creche gratuita, para onde uma boa parte dos pais mandam os filhos com o objetivo de arranjar algo para eles fazerem no tempo livre, assim como muito dos adultos que lá frequentam. Não haveria nenhum problema nisso, afinal, como diz o velho ditado popular, “cabeça vazia é oficina do diabo” (e é muito melhor que as pessoas estejam frequentando cursos de arte do que aprendendo o que não presta por aí), se essa estrutura paquidérmica não consumisse praticamente todo o orçamento anual da cultura, deixando todo o resto à míngua e com isso levando à precarização da indústria cultural profissional da cidade, que depende vitalmente de público para existir e se desenvolver.

O não equilíbrio entre essa iniciação às artes e formação de público faz com que essas pessoas (com as devidas exceções) percam o interesse pela cultura assim que saem dos cursos, pois a elas não foi incutido o gosto perene, permanente, pelo assunto. É muito sintomático o fato de que não se veja essas pessoas em eventos culturais na cidade, com exceção daqueles diretamente ligados a elas, como as apresentações de final de ano organizadas pela Secretaria da Cultura.

Alguma coisa está seriamente errada quando por exemplo, com a quantidade de cursos ligados à música oferecidos pelo Centro Cultural, não consigamos lotar um teatro de pouco mais de 300 lugares para um concerto da orquestra da cidade. É preciso urgentemente se repensar esse modelo de cultura, e ter coragem para fazer as mudanças necessárias, sob pena de continuarmos batendo recordes em números que só servem para os prefeitos usarem na campanha eleitoral.

Genivaldo Amorim é artista plástico e produtor cultural.

1 Comentário

  1. Muito boa esta crítica !! Há muito tempo que os poucos e parcos recursos aplicados em Cultura pelo Brasil afora não têm outro objetivo que não a pescaria de votos para as eleições. É esta uma das razões pela qual nosso povo assiste inerte ao quadro de horrores posto em prática pelo atual (des) governo e gasta várias horas de impulso telefônico para votar no Big Brother ( que se mantém campeão de audiência)

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