
Final dos anos 1970. O Brasil já não aguentava mais os generais, e os milicos começavam a se tocar que longos anos de ditadura haviam passado da conta. Prova disso veio do próprio João Figueiredo, último general presidente, com suas célebres frases: “prefiro cheiro de cavalo do que cheiro de povo” e “peço ao povo que me esqueça”.
Os muros começaram a pichar e, em Valinhos, umas das paredes preferidas eram as do colégio Cyro de Barros Resende, o Cyrão, para os íntimos. Não me recordo se já rolava, naqueles tempos sombrios, a discussão sobre se pichação era arte, protesto ou vandalismo. Lembro-me bem, no entanto, de uma letrada na fachada do colégio; grafia firme de spray preto: “Somos filhos da terra do figo, não do Figueiredo”.
Não tive dúvida. Cliquei com a kodak, mandei revelar no Parodi, e enviei a foto da criativa pichação para ilustrar minha coluna no Jornal Hoje, de Campinas. O jornal diário, de propriedade do Orestes Quércia, tinha como diretor de redação o valinhense Celso Luglio, que me convidara para ser o correspondente em Valinhos.
Passados alguns dias, recebo pelo correio uma carta, cujo remetente confessava a autoria do protesto no muro do Cyrão: Gérsio Pelegatti, Rua São Carlos, Bairro São Cristóvao, Valinhos.
Tratei de buscar a casa no endereço indicado na carta, e foi assim que conheci Gérsio Pelegatti.
Hoje em dia, o professor Gérsio grafita as redes sociais com as palavras firmes e criativas de sempre, mesclando poesia e protesto, denunciando hipocrisias e mazelas da terra do figo, no país em que alguns comemoram a volta de um Figueiredo.


